terça-feira, 15 de janeiro de 2008

Sobre janeiro

"Janeiro chegou
a chuva não quer parar
(...)
Procuro os livros,
e a paz nos amigos
Mas o meu coração
não é bom dos ouvidos!"
Gardenais
Esses dias meio cinzentos e abafados de janeiro parecem insistir em nos mostrar que quando a gente se deixa acomodar tudo ao redor fica medíocre. Você deita na poltrona e não se preocupa nem mesmo em ajeitar a coluna. Não, é mais fácil assim, sujeito ridículo. Os dias começam ao meio-dia e não acabam, as horas se arrastam, o sol aparece tímido no meio da tarde (putz, ainda são quatro horas?). "O que são mais longos: os dias ou as noites?". Enquanto ainda é dia a resposta mais certa parece ser o dia, afinal o tempo úmido te sufoca na sua monotonia. Mas as insônias de janeiro são piores, afinal não existe nem com o que se preocupar. Sujeito desinteressante. Você até pensa que sua vida seria melhor se você se contentasse com um emprego medíocre (assim como você), com o cheque especial, ou uma viagem pra praia no Carnaval. Não, você é medíocre, desinteressante, monótono, e o que é pior, você não se encaixa. Você não é como os outros. As mangas das suas roupas estão sempre compridas demais, as barras das calças rotas, você vai ao cinema sozinho, bebe ou chora excessivamente, ou os dois, chega sempre atrasado, perde o ônibus (maldito sujeito, não tem nem habilitação!). Mas janeiro não te respeita, sujeito desajeitado, "cara estranho", como da banda que você insiste em gostar, janeiro te odeia, e insiste em te mostrar.Janeiro vem como um espelho que te mostra o quanto você é "destentado e feio". Janeiro definitivamente não te respeita. Não mesmo. Janeiro insiste em chegar. O sol de janeiro brilha pra todos, mas sobre sua cabeça janeiro é cinzento. São as chuvas de verão, você pensa. Verão pra quê? Praia cheia, fedor de cigarro, sol queimando, gente quase bonita. Não. Você sujeito chato, prefere a praia vazia, cheiro de brisa, noite estrelada e gente bonita de verdade, daquele jeito que só as pessoas bonitas de verdade sabem ser, sem produção, sem moldes. Janeiro pra quê? Você é daqueles sujeitinhos que preferem o céu de fim de tarde de maio, as flores de outubro (como as da Laís!), o sol brilhante e frio de julho, as luzes de dezembro, os ventos de agosto, a monotonia de março, o marasmo de novembro. Mas janeiro é muito eufórico. Em janeiro falta amor, você sabe, sujeito eternamente apaixonado, ninguém ama em janeiro. Janeiro tem bundas demais, festas demais, axe demais, enfim tudo é demais em janeiro, não sobra tempo pro amor. E você cantarola baixinho, sujeito controverso, a musiquinha de axé: "amor de praia não sobre serra". Sobe, você pensa. Mas eles não sabem o que é o amor, amor sobre serra, atravessa o gelo descalço ou o oceano a nado. Todos passam janeiro esperando o carnaval. E você passa por janeiro esperando que um dia essa euforia passe também por você. Quem sabe janeiro que vem, você, sujeito blasé, mude sua cara de paisagem e faça parte dessa grande festa. Não. Você sabe que não.


Foto achada na internet, como não tinha o nome do fotógrafo, não pude colocar os devidos créditos.