sábado, 29 de dezembro de 2007

Lápis e papel




Escrevo como se precisasse fugir da minha vida em busca de um abrigo ou um amigo. Escrevo como se tivesse fome e meus dedos bicassem as teclas para encontrar um pão, um sonho... uma certeza. Não leio o que escrevo. Tenho medo de ver a minha fome, e conhecer o texto que uso como pretexto para esconder o meu medo de viver. Tenho medo e desejo de escrever... e de morrer. Escrevo para acabar com esta falta que, sei, jamais será preenchida. Está escondida, atrás deste texto que eu escrevo sem ver.




Texto da Ana, seu blog é esse: http://monocromacialirica.blogspot.com/ (Afinal, como o texto não é meu, sempre bom colocar a referência neeeeam)


E não é apenas porque eu não tive tempo pra escrever, mas porque acho esse texto fantástico.



=D





quinta-feira, 27 de dezembro de 2007

um soneto

Soneto XXI

Criou o homem, Deus, de brincadeira
E fê-lo belo, a si refletido
Deu-lhe ilusão e folhas de videira
À imperfeição tornou-o divertido

E tão bem pôs-lhe enganos na algibeira
Que humano, mais que havia de ter sido,
Tornou-se o homem e à mesma maneira,
Mais que entende Deus, triste e sofrido.

À frente o criador entre seus jogos
Sem perceber a cria, esta sem vê-lo,
Aquele a rir em seus secretos planos.

O homem sempre à busca d’um tal logos,
E ri-se Deus, que não sabe os apelos
Daquele que em vida é humano.

2005

Laís de Oliveira

sábado, 22 de dezembro de 2007

Diário de ninguém

A menina olha pela janela embaçada do ônibus, chovia bastante, a estrada estava toda esburacada e tudo que ela queria era chegar em casa. Mas ela sabia que sua casa não era sua casa mais, e também sabia que não faria tanta diferença assim mudar de lugar.
Ela continuava a olhar pela janela... Então vê uma árvore imensa, única em meio de um pasto ainda mais imenso, pensa: “Ela deve ter ficado assim, durante anos...”. Não, não havia muito o que pensar ali. A bateria do mp3 havia acabado, e olhar pela janela era tudo que ela podia fazer.
O ônibus ia devagar, sacudia, pessoas conversando alto, crianças chorando, mas, de repente, aquela vontade tão grande de chegar em casa passou. Chegar pra quê? Ela voltava na tentativa de resolver problemas, e sabia que dificilmente conseguiria. No final das contas, não dependia dela. Sabia também que todos a esperavam, esperavam por ações que ela deveria fazer, mas que não queria. Então, na tentativa de esquecer de tudo, ela fazia desenhos e escrevia nomes no vidro embaçado, “que coisa de criança!”, pensa.

A menina, entretanto, não é mais uma menina.
E depois de dois dias, as malas continuam lá, intocadas.








Por B.G.

quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

Laís de Oliveira - Nós



E então, nós.
Que fim que leva
a imprudência dessas mãos?
Nesse entrelaço de dedos,
embaraço, aperto, medos
nós atados num exato
apito de trem
advento de desato
enfim, sós.
trilho, estação.

Laís de Oliveira















Imagem: Urban Romance, Mattew Alan

Cíntia Melo - Dos 19 anos

Sao tantas, em tao poucos anos, as velas que ja soprei, que as vezes e quase como se a gente se esquecesse de nos mesmos. Em cada ano eu me desfaço e me refaço, deixando pedaços de mim pelos cantos, com os amigos, que vieram e que virao. Nesses 19 anos ja fui tanta gente que ja nao sei mais, sem nunca deixar de ser quem eu sou. Em tao pouco tempo os anos foram se passando por mim, sem que eu me desse conta. Nao que sejam muitos, 19 anos a vida nem começou. Mas foi ao apagar as velinhas hoje que eu senti tantos momentos intensos ja vividos.


Ressaca, texto ruim, so pra postar, foi mal a ausencia! =/

sábado, 15 de dezembro de 2007

Coisa de buteco

Não, não quero abandonar isso aqui.
É uma saída boa, útil, mas não fácil.
Não ando com vontade de escrever... Queria postar algum texto de alguém, entretanto, nem mesmo isso me veio à cabeça.
Talvez seja porque meus sentimentos são sempre os mesmos, assim como minhas idéias, e,por mais que continuem aqui, tentando gritar, dia pós dia, continuarão silenciados. Escrever reprime o grito, não o silêncio.

Pouco tempo atrás, saindo de um bar perto da minha casa, uma amiga me perguntou se eu preferia uma alegria falsa ou uma tristeza verdadeira. Alegria falsa, disse. Ela me olhou chocada. Perguntou aos outros, e todos responderam que preferiam uma tristeza verdadeira. Então, ela olhou pra mim, arqueou as sobrancelhas, e me disse vários argumentos, bons, admito, para me convencer do contrário. Olhei calmamente e disse: ainda sim, prefiro uma alegria falsa. Conhecendo-a como conheço, ela brigaria por sua opinião durante horas a fio, se houvesse alguma chance de convencer-me, mas viu que não era o caso.

O fato é que a pergunta foi o que eu preferia, um ou outro, e tristezas verdadeiras não me interessam. O quanto mais longe eu puder passar dela, lhes digo, passarei. Covardia? Sim, porque não.
Creio que esteja aí o problema. Escrever coloca o meu pé na realidade, em minhas tristezas verdadeiras, em minhas alegrias falsas. Escrever me mostra o conflito entre o silêncio que eu forço e o grito que insiste sair.

De qualquer forma, louco mesmo é quem só quer viver de realidade.
O que não significa que eu não seja louca, claro.





"Suddenly I see
Why the hell it means so much to me?"

quinta-feira, 13 de dezembro de 2007

Marinha


"Oh Madalena, o meu peito percebeu
que o mar é uma gota
comparado ao pranto meu"
Ivan Lins
Imagem: Marinha, Portinari
"...
Nessa calma de água
esse ar de alma
..."
trecho de Porto, Laís de Oliveira

sábado, 1 de dezembro de 2007

Mas se tu me cativas...

Hoje o dia acordou com cara de domingo. Não sei explicar... Talvez seja a monotonia, o céu nublado, a vontade de dormir o dia todo e não ver ninguém.
O fato é que meu desespero para que o tempo passe, para que as coisas aconteçam, têm me impedido de viver o presente, têm me feito uma pessoa ansiosa, mais impaciente do que eu usualmente sou, e, acredite, o normal já é exagero. O agora não me contenta, e eu não sei o que fazer quanto a isso. Quem sabe?
É a minha paz que eu procuro. Talvez ela esteja simplesmente em uma boa noite de sono, ou em uma longa caminhada na praia...
Enfim...
O ser humano é uma criatura deveras engraçada.






“- Os homens, disse o principezinho, se enfurnam nos rápidos, mas não sabem o que procuram. Então eles se agitam, ficam rodando à toa...”

“- Onde estão os homens? repetiu enfim o principezinho. A gente está um pouco só no deserto.
- Entre os homens também, disse a serpente.”

quinta-feira, 29 de novembro de 2007

Diálogo com ramos, rosa e barros

(ensaio de coisa sem final)

Um pássaro do qual não sei o nome piou três vezes infinitamente.
A noite vinha calma como quem anda na roça. Quieta, de ar parado, vinha lenta num andar de cores claras para escuras, degradando como quem atrasa o passo de ir ao chão. Vinha num caminhar manso que pára e colhe flores nos joelhos. A noite lenta vinha acompanhada do assovio deste pássaro do qual não sei o nome. Penso que nem a noite o sabe...nem entanto se importa ou pensa nisso em hora de apanhar estrelas.
Que interessa um nome seco que, falado, cala após e cessa? A ela, mais se presta o assovio que é contínuo, constante e repetido. Penso que música anda mais que nome e a noite pensa assim, comigo. A Serenata Noturna andou mais que Mozart: a noite se enche disso.
Eu ouço o pio como quem conversa e falo em tom de quem respira e troco notas de vazio com o assovio lá do pássaro e com o andar da noite.

Laís de Oliveira


imagem: Espantalho, de Portinari (1957)

terça-feira, 27 de novembro de 2007

Mariana

Mariana pura e bela
cada lágrima,
carregada de ódio e pecado
cai para sarar a alma
e escapar desse cruel e frio,
mundo, imundo de prazer e medo
Como um anjo ferido
em meioa a essa guerra
e a tantos rostos perdidos
Mariana,
com um brilho único
no sombrio olhar
Mariana de contrastes,
tão longe e tão perto
branca, corrompida
negra, intocada
Doce de mel,
doce de fel
Lutando pela sua sanidade
Sobrevivendo num mundo
que não a merece
Este não é lugar para pessoas
bla como ela é
De lúdica loucura
De insana sensatez
Mariana que grita
e ninguém ouve
que se segura e foge
que abafa o sentimento puro
Maria que é Ana
nem mãe, nem avó
Mariana que é muitas...
Que chora...
Mariana,
meninas também choram.




Postado por Cíntia Melo

sábado, 24 de novembro de 2007

Mudando a casa decimal


Acordo, olho para o teto e vejo meu ventilador. Estou em casa. Minha cabeça dói. Novamente, bebi mais do que devia, mais do que me era necessário. Então começo a recuperar meu raciocínio... Meu Deus, hoje é meu aniversário. Eu odeio meu aniversário. Não. Não é porque “noooossa, estou ficando mais velha”, e nem nada parecido. Afinal, eu fiz 20 anos, não 40. No meu desejo, hoje nada mais seria que um dia comum, assim como também seria o dia do reveillon. Mas não me deixam, não me permitem. Então, fazem desse dia um dia diferente, especial, mas não por minha vontade. Crio expectativas. Eu não suporto expectativas. E então eu olho pro telefone, e penso, quem vai ligar... Fulano, ciclano, tem que ligar, caso contrário... Caso contrário nada. Serão apenas mais algumas das várias frustrações que eu tive na minha vida, que qualquer um teve, e gostaria que não tivesse. E então eu lembro do pensamento de uma semana atrás: o que eu vou fazer no dia? Onde? Quem eu chamo? Fazer nada se torna algo impossível. E seu aniversário acaba sendo uma lista, na qual você decide quem são seus amigos, quem não é tanto assim. E na verdade você não decide. Meras ilusões. Minha vontade é dormir profundamente e acordar domingo, com meus 20 felizes anos, ainda com minhas vagas expectativas, meus sonhos incompreensíveis; e, assim, ser feliz para sempre, como nos contos de fada.





“She moves on her own way...”

quinta-feira, 22 de novembro de 2007

Laís de Oliveira - O filho que eu quero ter



Uma música me fez querer um filho.
Só por deixar pesar nos braços e deixar pesar o sono nos olhinhos, daquele peso de um dia cheio de novidades cheias de cores.
Pela delícia de cantar uma canção de ninar.
E tão sutil a vontade, qual ela fosse meu próprio filho adormecendo. Tão pura que, como suavizasse a voz para cantar, eu tentasse escrever suave para não assustá-la.

De medo de estragar um querer repentino e bonito, quase infantil. Quase meu filho.


Laís de Oliveira

"Linda, cuando vos quieras,
dejo este amor donde lo encontré.
En tren con destino errado
Se va más lento que andando a pié... "

Detalhe de "As Três Idades da Mulher", de Klimt.

terça-feira, 20 de novembro de 2007

Dos olhos verdes

"Já falei tantas vezes
do verde dos teus olhos
todos os sentimentos lhe tocam a alma
alegria ou tristeza!"
Maria Rita

O verde-cinza-azul dos teus olhos já comeram minha paz. Virou rima recorrente dos poemas piegas que eu faço na ânsia de te esquecer. Mesmo sabendo que meu maior esforço é para mantê-los sempre vivos na minha memória. Eu vejo em tudo que é belo o reflexo dos teus olhos furta-cor. Meus cafés são cada dia mais amargos, as insônias mais solitárias, as horas no analista mais angustiantes e as doses de vodka cada dia mais fortes. Tudo isso pela busca incessante de cruzar meu olhar ao teu, ao menos mais uma vez. De ver teus olhos azuis de desespero me suplicando paz; tão cinzas, como se fazia cinza o mundo para ti; e tão verdes, como verde é a esperança em que eu tentao acreditar quando a lembrança de tua imagem me dilacera a alma. Teus olhos multicoloridos me mostraram os caminhos mais perdidos em que eu já me encontrei. E me perdi. Me perdi sem seu olhar de guia, de protetor, e de anjo caído. Mais uma vez as horas se arrastam, e eu aqui me torturando com a idéia de teu olhar infantil buscando nos meus olhos distraídos abrigo pros teus tantos medos camuflados. E eu aqui tão longe, sem teus olhos não tenho mais nada!


Postado por: Cíntia Melo

sábado, 17 de novembro de 2007

Sem título.

Procuro por olhares que me dêem respostas, mas, quando os encontro, são olhares perdidos, não correspondidos. Olhares que não condizem com as ações, que não trazem nada além de mais dúvidas, mais contradições, lembranças que deveriam ser esquecidas. Olhares que não querem ser encontrados, talvez por medo de serem revelados. Olhares que me mostram uma pessoa que eu não conheço, não mais.
Mas então, no dia seguinte, com a garrafa de água na mão, percebo que o que eu quero não são respostas. O que eu busco são mentiras verdadeiras, revelações que me interessem, algo para preencher esse vazio que me desespera, me corrói. Não quero respostas. A verdade está clara, sempre esteve. E eu não a quero.

Sofro na incerteza, no silêncio do que nunca vem, nunca toca. E não muda.


“And it makes me think there must be something wrong with me
Out of all the hours thinking
Somehow I've lost my mind
But I'm not crazy, I'm just a little unwell”
(Matchbox 20)
Por B.G.

quinta-feira, 15 de novembro de 2007

Laís de Oliveira - Maria de Açúcar

"Com açúcar, com afeto
Fiz seu doce predileto"
Chico


Certa Maria

O que dói no meu peito
È como se você fosse ser sempre essa agonia
Sempre o mesmo aperto
Um não dormir direito que me embala
Nos teus sonhos
Tuas falas, teus sorrisos
Como se eu nunca mais tivesse sono
Nunca mais tivesse como,
Jeito, ou tema pra poesia
Eu sempre e você, meu servo e dono.
Sempre eu, sempre Maria
Eu pra sempre a seu respeito.

Laís de Oliveira

terça-feira, 13 de novembro de 2007

Então..


É estranho chegar em casa depois de tanto tempo.
Mesmo que meu quarto em BH seja repleto de móveis que nem são meus, eu sinto que é lá que me pertence. Talvez essa sensação faça parte do que é crescer, se tornar um adulto.
Sábado eu vi um filme (Lobos e cordeiros) em que um professor fala pra um aluno que o mais difícil em se tornar um adulto é que a gente não percebe quando isso acontece e que é preciso ter cuidado, porque pequenas decisões tomadas hoje levarão anos para serem mudadas. A fala dele foi brilhante, fiquei minutos pensando sobre e é uma pena não conseguir retratar aqui exatamente tudo que ele falou.

O fato é que Patos me passa um sentimento nostálgico, dos dias, momentos, esquinas em que se passaram conversas intermináveis, bares e restaurantes que eu freqüentava com pessoas que fizeram parte da minha vida durante anos e que hoje eu mal as conheço, assim como elas mal me conhecem. As casas em que morei, as ruas nas quais eu caí andando de patins, as árvores em que eu subia, hoje cortadas.

Não trato nostalgia como tristeza. Nem como saudade. Voltar me faz entender porque eu fui embora. Crescer aqui foi a melhor coisa que podia ter me acontecido, a infância em cidade pequena é mais feliz, afinal, nada como fazer coisas como jogar amarelinha na rua e desligar o padrão da vizinhança. Mas eu não consigo me ver aqui pro resto da vida. Morar em cidade pequena é bom em um filme, onde as pessoas andam de bicicleta e trocam alimentos e alfinetadas com os vizinhos. A realidade passa distante.

Voltar pra cá me faz sentir velha. Acho que é isso.







"So here I go, still scratching around the same old hole

My body feels young but my mind is very old

So what do you say?

You can't give me the dreams that are mine anyway

You're half the world away

Half the world away...

I've been lost, I've been found, but I don't feel down."

(Oasis)




Por B.G.

sábado, 10 de novembro de 2007

C. Melo- Das lembranças

"How happy is the blameless Vestal's lot!
The world forgetting, by the world forgot
Eternal sunshine of the spotless mind!
Each pray'r accepted, and each wish resign'd"
Alexander Pope


Acaba a noite, acaba a festa, acaba o alcool, acaba o spleen, tudo acaba, deixa de ser num instante tão rápido que passa despercebido aos nossos olhos. Mas inevitavelmente nasce um novo dia, mesmo que tudo tenha acabado, alguma coisa fica. Essa coisa que fica talvez seja a única que não deveria ficar. Mas de tão bem guardade que é a gente não tem nem a opção de esconder, fingir que não tá vendo, que não tá sentindo. Os olhos boiando no espelho do banheiro mostram a verdade crua. Cada lembrança se encaixando quase que num quebra-cabeça sádico. Lembranças, boas, ruins, lembranças insistente. Que maravilha seria poder escolhe-las. Lembranças!

quinta-feira, 8 de novembro de 2007

Horas

Descansa, poetisa, que teus versos são tuas horas
Vê, tua poesia é o teu tempo
Não crê que alguma outra voz te chama
Que não a que tu mesma cria.
Não assusta teu rosto com ponteiros
Rijos, pesados, marcados de tédio
Que eles quebram fácil com o vento
Que em teus cabelos passa e tu esquece.

Laís de Oliveira
















imagem: Reloj blando en el momento de su primera explosion - Salvador Dalí



"Every year is getting shorter, never seem to find the time
Plans that either come to naught or half a page of scribbled lines"
Time - Pink Floyd

terça-feira, 6 de novembro de 2007

Dando voltas

O ser humano tem uma capacidade engraçada de fingir que está bem, sempre feliz, saltitante, comunicativo. Parece que a tristeza, a infelicidade, o tédio são sentimentos fracos, indemonstráveis. Eu perdi essa parte da evolução.

Posso mentir pra mim mesma e me enganar de forma primorosa. Sou capaz de criar ilusões que, de tão distorcidas, me parecem reais, e viver assim em um mundo imaginário onde não necessariamente sou mais feliz. Mas não se engane... Este meu mundo é pessimista em relação a tudo (minto, exceto uma coisa, que eu jamais poderia dizer aqui), e nele eu continuo sendo uma pessoa dotada de impedimentos que, na maioria das vezes, não existem, e alguém que possui um conformismo em relação às coisas difíceis da vida que simplesmente não deveria existir. Meu mundo é ilusório porque eu distorço a realidade, mas isso não significa que eu tenha nele uma visão distorcida de mim mesma.

Em compensação, para os outros eu não consigo fingir nem uma dor de cabeça, quanto mais felicidade. Não estou tratando essa minha capacidade de fingir mal e mentir pior ainda como uma qualidade ou um defeito. Claro que sinceridade é um valor indispensável, mas seria hipocrisia dizer que a verdade deve sempre ser dita, não importa a ocasião. Mas, para mim, pouco interessa. Quem realmente me conhece decifra-me em poucos segundos, seja pelo olhar perdido, pelo sorriso frouxo ou pelas mãos inquietas.

Mas não é por não conseguir fazer o mesmo e nem por achar uma falsidade desnecessária que pessoas que fazem questão de se mostrar sempre felizes me irritam. É uma perda de tempo se esforçar tanto pra passar uma imagem tão irreal e desgastada. O ser humano é por si só fraco e suscetível a mudanças e incertezas e não admitir isso sim é uma fraqueza imensurável. A frustração é um componente constante em nossas vidas, mesmo porque, se não fosse, não viveríamos nessa busca incessante por algo que nos complete. O que existe são pedacinhos de felicidade, que encontramos dia pós dia, porque o homem é insaciável, passa toda uma vida procurando por algo que, de fato, nunca encontrará por inteiro.

E perceber isso não faz ninguém passar toda uma vida sorrindo.




P s : é, acordei me sentindo oca hoje.




Por B.G.!

sábado, 3 de novembro de 2007

Do copo pela metade

"Eu sei que nada tenho a dizer
Mas acabei dizendo sem querer
Palavra bandida
Sempre arruma um jeito de escapar!"
Móveis Coloniais de Acaju
Perdida no labiritno do quarteirão fechado da Pernambuco, achei as respostas para as perguntas que você nunca me fez. Não é que elas já não estivessem em mim, mas faltam-me as metáforas adequadas. Elas não podiam ser mais óbvias, mas precisei ouví-las displecentemente de um amigo ( desculpa aí pelo plágio). Eu só queria o copo pela metade, afinal de contas o que está meio vazio está também meio cheio. Eu nunca quis te pedir o que você não pudesse me dar, eu nem teria condições de receber tanto. Sua semi-presença me bastava, mais seria muito, menos é pouco.
Pequenos deslizes afloraram o óbvio- equilíbrio é ilusório e insustentável. Eu pequei pelo excesso, você compensou com a falta. Mas veja bem, você não foi para mim Diadorim, eu só gostei de sua companhia, dos risos descompromissados, e da tarde ociosa naquele café. Entende, eu só quero o copo pela metade, não é porque eu deixei transbordar que você deveria tê-lo esvaziado.
Busquemos, pois, a leveza de um artista de circo, para andarmos sobre a corda bamba do equilíbrio, para que as inseguranças e suposições não tomem o lugar da realidade livre e agradável, e, para que expectativas desproporcionadas não suguem do presente o doce sabor de estar sendo. Principalmente para que cada um tenha o espaço necessário para colar os pedaços quebrados de seu próprio coração. Porque cada um tem de ser inteiro apenas pra si próprio.
Oxalá tenha você entendido o que eu tento em palavras inteiras dizer. Mesmo que me faltem as palavras, ou que sejam elas meias-palavras.
Postado por: Cíntia Melo

quarta-feira, 31 de outubro de 2007

Quando eu crescer... eu quero ser grande!

No canto direito da sala, na primeira carteira, fico olhando o professor de Sociologia dizer palavras incompreensíveis, frases avulsas que não me passam nada. Ele parece estar no automático; não exibe qualquer tipo de emoção, muito pelo contrário, mostra uma indiferença assustadora ao fato de que no fundo da sala há um imenso barulho e que, a pequena parcela que não está fazendo outras coisas se encontra com um olhar distraído em algum ponto lá fora, através das janelas sujas de lodo.

Eu sempre quis fazer Direito. Quando criança, nunca quis ser médica, astronauta, bombeiro... Enfim, essas coisas que toda criança sonha. Não sabia o que eu queria, mas de qualquer maneira, não me interessava, eu me contentava em ser criança e sabia que não precisava pensar naquilo. Decidi qual curso faria ainda na quinta série, de maneira fácil: minha mãe fazia, fui em algumas aulas e pronto, era aquilo que eu queria. Nunca nem cogitei mudar de idéia.

Não tinha todos os planos arquitetados, aliás, não tinha quase nenhum Sabia que queria mudar de cidade, e que, para isso, eu teria que passar em uma faculdade federal. Sabia também que não queria ser aquele tipo de advogada arrogante que parece um manequim de loja, não por ter ideais de humildade ou coisa do gênero, longe disso, mas por motivos como “andar de salto dói o pé” e “viver de imagem, com o passar dos anos, deve se tornar algo bastante cansativo”, além disso, sempre tive aversão a estereótipos.

Meus desejos não estavam além daqueles de qualquer um. Queria estudar e trabalhar, mas não abriria mão de tempo para fazer aquilo que eu gostava, pois sabia que era algo que ainda faria muita falta com o passar dos anos, e que, caso fizesse, jamais me perdoaria por ter perdido o meu presente pensando demasiadamente no futuro.Queria ter dinheiro, mas não estaria disposta a ser refém dele. Queria ter minha liberdade, sempre, mas não significa que eu hesitaria em me prender a alguém, criar laços...

Então, olhando o professor, eu penso: é aquilo que ele queria pra vida dele?? Aquilo parecia tão... vazio. Afinal, planos são apenas planos e quem eu sou e decido ser na verdade significa pouco, ou quase nada, diante do que há de vir. Quantas vezes, nem poderia contar, meu planos saíram dos eixos e tudo acabou se perdendo de maneira incontrolável e, às vezes, dolorosa, sem que eu pudesse ao menos ver onde foi a falha? Ou se foi minha a falha... Mas talvez seja exatamente esta a beleza dos planos, o fato deles existirem sobre um futuro incerto e, ao mesmo tempo, excitante, que me amedronta e me encoraja.

Seria monótono viver apenas de presente, desperdício viver de passado.







P s : eu quero me formar em direito tributário, ser rica, casar aos 29, ter dois filhos e ser uma coroa gostosa.




por B.G.!

sábado, 27 de outubro de 2007

Apenas começando...

Aqui, sentada em frente ao computador à uma hora da manhã, quando todos os meus programas de “cair na gandaia” deram errado e quando o sono simplesmente não parece querer aparecer mesmo sem ter dormido quase nada nos últimos dias, nada me vem à cabeça senão entrar nesse mundo que minhas queridas amigas tanto amam e tanto me aconselham a entrar: o mundo das garotas do “Trem de Madalena”!
Há muito tempo, quando eu ainda era uma menina, ganhei um diário (aqueles que tinham uma chave, qual menina não teve?), e me falaram que era bom escrever, pra desabafar, para falar não só aquilo que eu não tinha coragem de dizer por aí, mas, também aquilo que tinha valor apenas para mim e que eu não queria que fosse compartilhado... Ou simplesmente para guardar lembranças, para que eu pudesse ler e sentir saudade de um tempo que se foi e que, provavelmente, eu queria que voltasse. Seria como o roteiro de minha própria vida.
Eu nunca passei de uma página.
Não sei explicar bem o motivo, se era apenas um bloqueio para escrever (o qual, lhes digo, tenho até hoje; um exemplo disso é que esta é a terceira vez que tento escrever algo para postar no blog), ou se eu não tinha mesmo era paciência. Acredito que sejam os dois. Lembro que no primeiro ano a professora de português deu um trabalho que era escrever em um caderno, 4 dias por semana, o que fazíamos, como um diário mesmo... Durante dois dias escrevi normalmente; então, passei a escrever apenas o que eu comia e quais aulas eu tinha na escola, até que duas semanas depois preferi perder 10 pontos.
Então, hoje, dia 27 de outubro, em meio a um sentimento não muito raro de solidão, decidi que não há motivos pra não tentar! E que, se há uma maneira de fazer com que a vida ande por um caminho mais fácil e claro, é enfrentar aquilo que me amedronta, aquilo que me impede ser alguém mais livre, mais aberto ao desconhecido. E se escrever é mesmo uma maneira de alcançar isso, por que não? Vai ver é apenas um começo... J


Os: Não, não vou fazer disso um diário, fiquem tranqüilos. :p



Bruna Gabriele, ou simplesmente Bg.

quinta-feira, 25 de outubro de 2007

Para preencher o dia...

Somente quem encontra-se perdido sabe o que é perder-se. Quem se diz perdido mente, pois exige sobriedade discernir quando se perde-se...só se descobre ao encontrar-se.

Texto aleatótio e, agora, quase impessoal...para preencher o dia:


Antes lhe importava que alguém desse de ser pro resto da vida. Dessas idéias de menina, que pensam que a vida é tanto que há por vir e que dez anos mudam o mundo. Não mudam. E agora, embora não tendo avançado em idade, era como se visse com clareza que a relatividade do tempo é a crença mais fiel que uma pessoa há de ter, que algo novo pode amadurecer e cessar em minutos e que certas coisas ficam toda a vida como novas. E que é natural que elas não envelheçam, que elas nem sequer desbotem ou curvem os ombros. Estranho aceitar que seja assim tão pouco o que há por vir e intenso o que há de ficar. Talvez haja algum medo do tédio, desde que talvez leve a alguma viagem, uma mudança ou outro corte de cabelo, para então estar de volta algum dia e angustiar-se pelo que poderia ter sido, pelas rugas e pelas dores, mas, mais ainda, pela cor viva nos olhos e nas maçãs do rosto, doendo por ser algo que não envelheceu.

Laís de Oliveira


"E lá se vai mais um dia..."
Clube da Esquina

quarta-feira, 24 de outubro de 2007

Do meu all star


Esses dias têm sido daqueles dias em que tudo que pode dar errado, com certeza deu errado. Mas, paradoxalmente eu tenho estado muito feliz, tão feliz que eu quase não consigo explicar. Eu achava que felicidade eu ia achar quando passasse num vestibular duma faculdade federal, ih ledo engano; depois pensei que eu precisava era de um namorado perfeito, desses lindos, quase um príncipe do cavalo branco, não é que ele apareceu, mas não adiantou nada; achei que era quando eu morasse sozinha; mudasse pro exterior; emagrecesse... eu tinha mil e uma idealizações grandiosas. E essa semana não aconteceu nada de notável. Eu adoeci, tive febre, quebrei a cara, tenho uma pilha de livros para ler, um trabalho chato pra fazer e uma casa pra limpar; mas de repente eu parei, olhei pra baixo, vi meu velho e sujo all star e me senti completamente feliz. Meu all star, que já deve ter lá seus três anos me mostrou quanta coisa boa eu tinha ao meu redor; em cada mancha dele tinham as marcas dos shows dos Los Hermanos, da chuva que tomei quando fui renovar meu passaporte, do trote do meu vestibular, de todos os dias que acordo sonolenta e o calço pra ir pra aula, das vezes que eu sentei com a Bárbara no chão da casa dela e falamos bobagem, dos cinemas que eu fui com o Bruno, da minha mãe querendo lavá-lo, do meu cachorro que mastigou o cadarço e etc.
Meu all star fuleiro passou então a ser o troféu da minha existência. De repente tudo começou a se ligar como que num tear mágico, todos os momentos que antes haviam passados despercebidos, desfilaram diante de mim, agora em câmera lenta e com zoom. O meu processo de desconstrução começara. Eu botei toda minha estabilidade a perder por um causa de um tênis tosco.
Meu apartamento que era tão pequeno ganhou dimensões inexploráveis, em cada canto um encanto. A rua hostil minha recebia com braços abertos, cada rosto se enrubescia quando eu passava, os prédios ficaram menos cinzas, e os carros menos barulhentos. A cidade então entendeu que por onde passavam meus pés calçados do meu all star, passava a felicidade.
Tudo se transformou. Os velhos moribundos nas calçadas se levantaram com seus trapos e dançaram com as madames, agora descalçadas de seus Pradas. os jovens descobriram soltaram seus planfetos e frases feitas e se juntaram à revolução da felicidade; as crianças mimadas, os cachorros vira-lata, o guarda mau-humorado, as mocinhas apaixonadas; todos em tom uníssono clamavam à felicidade! Felicidade que eu só pude ver quando meu all star roto, sujo e desbotado, se transformou em sapatos de rubi e me levou a passos largos pela estrada de tijolos amarelos para o mundo maravilhoso que está bem deabxio do meu nariz.

PS: Felicidade é a gente andar por aí sem ficar com o pé doendo neh?!


Postado por Cíntia Melo

quinta-feira, 18 de outubro de 2007

Para Candido Portinari

La Pajita
Inti-Illimani


Esta que era una niña de cera,

pero no era una niña de cera

era una gavilla en la era.

Pero no era una gavilla,

sino la flor tiesa de la maravilla.

Tampoco era la flor, sino que era

un rayito de sol pegado a la vidriera.

No era un rayito de sol siquiera,

una pajita dentro de mis ojitos era.

Alléguense a mirar como he perdido entera,

en este lagrimón, mi fiesta verdadera.

Imagem: Portinari - Maria Rosa e seus amigos fantasiados (Ilustração nº 7 do livro “Maria Rosa”, de Vera Kelsey)

Post por Maria Rosa

quarta-feira, 17 de outubro de 2007

Das Genis


Era sexta-feira, numa dessas aulas de Direito, Guimarães Rosa me mostrou que toda mulher é um pouco de Geni. Explico-me. Ser mulher é um pouco, ou melhor muito, de ser Geni, de se dar ao outro e nem sempre receber de volta. Só mulher pode ser mãe, isso por si só, já explica muito. É mulher que dá seu útero, para gerar por nove meses os filhos que um dia serão do mundo, ela dá a luz, a vida, o leite, o carinho, e as noites sem dormir, mas como falar só no lado materno de ser mulher seria cair em pieguices e frases feitas. Mulher se doa de muitas outras maneiras. Ser mulher é seguir cotidianamente um ritual quase sagrado. Um ritual de doação. Para mulher nunca falta tempo, ela veste os filhos, vai à academia, trabalha, estuda, mantém a casa em ordem, se pinta, canta, colhe flores, se mostra e se esconde num mesmo momento. Somos elas, que estamos lá para perguntar como foi o trabalho, entendê-los nos momentos de estresse, nos interessarmos pelas coisas da faculdade deles. Somos nós, somos elas, que fazemos unha, cabelo, massagem, comida, faxina, bolo. Ainda sobra tempo pra tomar o iorgute zero de gordura, pentear os cabelos com carinho, passar o batom que combina com o tom da pele, calçar o sapato de salto e chegar a tempo para reunião daquele emprego super importante. Manter-se bela para o bem de todos. Fazer sempre pelo coletivo. Tudo bem que não é preciso "deitar-se com homem tão nobre, tão cheirando a brilho e a cobre (...) do enorme zepelim prateado", às vezes é mais sutil, como engolir o choro, fingir o orgasmo, ou assistir pela décima vez com o filho o filme do Nemo.
Não falo isso por machismo ou femismo, Pagu, Beauvoir, e outras, todas se doaram; Pagu foi tanto do comunismo, como de Oswald Andrade e Rudá; Beauvoir se doou ao existencialismo, ao feminismo e a Sartre. Elas, como eu, como minha mãe, minha vó e tantas outras Marias Mulheres por aí, nos doamos, ao Direito, aos maridos, à Engenharia, aos filhos,ao Greenpeace, ao namorado, à política, às amigas, ao xadrez, ao skate, ao ballet... Porque toda mulher é Geni e Benfazeja, em maior ou menor grau!

Na foto Pagu, Oswald Andrade e o filho Rudá

Postado por: Anne Keat

sexta-feira, 12 de outubro de 2007

Suco de Mangaba com couve

Hoje eu acordei de ressaca. Liguei moribundamente a TV e lá estava ele, lindo e tentador. Todo prata. Com um milhão de acessórios (vendidos separadamente, claro). Euforicamente comecei a anotar os números! “Eles dividem de tantas vezes, nem é caro”, pensei. E me imaginei, toda charmosa, na cozinha com ele.

Eu.

Que odeio cozinha.

Queria um Juicer Valita e descobri que eu precisava muito dele. Queria pra poder fazer mais de 200 tipos de suco. Não que eu re-al-men-te vá fazê-lo mas só pra ter a possibilidade. Só pra dizer pra todo mundo que Eu POSSO fazer sucos estranhos de beterraba com abacaxi com casca. Isso sempre acontece! Há um tempo eu queria um Grill George Foreman só pra poder esquentar os pãezinhos naquela estufa super chique de esquentar pãezinhos! Mesmo que eu não goste do pão esquentadinho, eu só queria ter aquela estufa. Não tenho uma explicação lógica pra essa minha compulsão por coisas vendidas na polishop, mas aposto que, secretamente, todo mundo quer aquelas coisas também.

E isso me fez pensar na quantidade de coisas inúteis que tenho na vida só pra dizer que tenho. Por uns tempos tive namorado, por outros, depressão. Já tive sapatos, vergonha, cd do Chico, remorso, roupa de marca, empatia... só pra dizer que tinha. E na verdade, às vezes, eu nem tinha.

O que me deixa chateada comigo mesma é que todas essas coisas são culturais; e dizem de você. Para parecer culto, um livro do kant ao lado da cama, ou aquele cd antigo do Chico que ninguém conhece. Para parecer ingênua, timidez. Para parecer sexy, sapatos desconfortáveis e saias curtas que te enlouquecem pra se sentar, andar e abaixar. Para parecer boa, remorso. Para parecer doce, animais de estimação. Para parecer simpática, empatia. E assim vão se construindo os 1 milhão de estereótipos que tenho em mente para parecer coisas que na verdade eu nem sou... só gostaria de parecer porque isso é valorizado pelos outros; e eu gosto dos outros e quero que gostem de mim. Eu nem gosto muito do kant e num sou nem um pouco tímida, nem ingênua. Mas já fiz isso tantas vezes que parece natural. Aliás quando eu digo alguma coisa fora do permitido sou considerada boca suja, safada, medíocre; mesmo que todos ali estivessem pensando a mesma coisa!! Pôxa! Tava TODO MUNDO pensando! Eu só disse! E isso me torna extremamente SUBVERSIVA; o que nem sempre é bom, afinal de contas eu sou uma menina e tenho que me portar como tal: “Sentar de pernas cruzadas, usar muitas saias, comer com talheres, ser como todas as mulheres...” fúteis. Isso é tão arquétipo pra mim e me fez pensar no quanto tenho sido superficial; assim, do latim superficiale: “pouco profundo, pouco sólido, sem descer a minúcias”. Do quanto tenho sido leviana, vivendo de aparências. Mas como ser profunda, sólida, minuciosa numa cultura em que o importante é ter seios fartos e uma bunda dura?

Não sou puritana, odeio sapatos, não tenho paciência pra terminar meia página do Kant, não sou tímida. nem um pouco ingênua, e, às vezes, não tenho remorso! É ! Eu Sou má, safada, leiga, sem modos.. Hoje, sou o que quiserem dizer de mim porque eu escolhi admitir a minha pequenez e contar pra todo mundo que adoro uma boa cerveja gelada e novela, como pizza com a mão, sento de perna aberta, me divirto comendo cachorro quente de madrugada sentada no meio fio, falo sem pensar, adoro um bom sexo e já tenho idade suficiente pra comprar um juicer valita! Mesmo que eu não vá fazer tantos sucos.


Postado por: Gabi Moreira

quinta-feira, 11 de outubro de 2007

Mudança e Reforma

Não se imagina quanta poeira cai em uma reforma. Das poeiras, a que mais se sente é a que não suja os pés, a que foi limpa antes que você chegasse.
“Minha casa não é minha, nem é meu este lugar”. Talvez o seja o lugar de onde vim em voltar para casa, lugar que pode ser que seja já minha casa e não este lugar onde estou. As paredes daqui pedem as novidades difíceis de serem contadas, mesmo para as paredes. Eu as conheço, sei como acomodar as costas nelas, mas pergunto por quê estão, assim, rejuvenescidas... Eu me sinto mais velha. Parece que minha reforma foi ao contrário e, no entanto, o novo envelhecido em mim é tácito, a vista não alcança nem é possível de se explicar – o que não implica a interação com paredes, que não têm e olhos e duvido muito que tenham ouvidos. Talvez a novidade se possa sentir e parede sente. Mesmo assim eu sinto, nelas, uma indiferença de branco, de gelo. Difícil confiar em quem se pinta assim... não se sente à vontade para falar de novidades...no máximo, para acomodar as costas. Coisa antiga pintando-se de nova... não se pode confiar. Talvez seja excesso de implicância com as paredes...talvez devido ao fato de que, entre elas e eu pinta uma empatia, tácita como nossa interação. Paredes sabem descobrir segredos – tenham elas ouvidos ou não. Descobrem mesmo aqueles que ainda escondemos de nós mesmos; talvez o que me incomodasse nas mesmas paredes antigas pintando-se de novas fosse que elas soubessem que minha reforma é como a delas.
Talvez.

Laís de Oliveira

Do mais que é mais sério é mais díficil escrever.

"...
Wake up naked drinking coffee
Making plans to change the world
While the world is changing us
It was good good love
You used to laugh under the covers
Maybe not so often now
But the way I used to laugh with you
Was loud and hard
..."

Dave Matthews' Band, Stay or Leave

quarta-feira, 10 de outubro de 2007

Das duas Berlins

A ausência de Ferdinand me ansinou a amar Franz, que por vezes estava mais longe do que o próprio Ferdinand, que habitava muito além mar. E um se tornoun a extensão do outro, como as duas Berlins, e eu era o muro que ligava esses dois mundo tão diferentes. Ora eu amava Franz, meu amante ocidental, ora eu amava Ferdinand, com seu charme quase clandestino de Europa oriental. E quando eu falava com Franz, olhando nos seus olhos negros como a noite, eu podia ver o reflexo dos olhos azuis de céu manhã de Ferdinand. E nas madrugadas insones que eu passava contando segredos de amor para Ferdinand eu olhava ansiosa para o telefone, esperando por Franz que não me ligava. E nos meus sonhos confusos, Franz era Ferdinand e vice-versa. Um se misturava no outro de forma tão intríseca que por vezes eu já não mais conseguia distinguí-los. A mesma pele branca, os lábios rosados, as camisas pretas. E numa alucinação embriagante eu via um na imagem do outro. Por esses dias que eu passei a amar Franz como eu amava Ferdinand, eu devaneava por horas, quase acreditando que eu poderia ter ambos. Que eu seria duas em uma só, por vezes na correria racional do Ocidente, e por outras na quietude quase febril do Oriente. Franz era a Berlim ocidental, pela segurança que me dava, ele era daquele amor que constrói todo dia, que precisa de investimento constante; E já o amor de Ferdinand requeria devoção total, como a dos comunistas, pedia renúncia a tudo com o que eu já havia me acostumado. Eu queria tanto os dois, queria Franz e queria Ferdinand, eu queria Franz Ferdinand. E essa paixão dividida, foi virando transformando em meu íntimo em agitação que culminaria em guerra; guerra de mim contra mim mesma.


Postado por: Anne Keat

segunda-feira, 8 de outubro de 2007

...Do medo de me envolver...

É sempre assim.. Ele vem todo lindo e manhoso, com palavras doces e delicadas que me fazem sonhar. Me dá beijos demorados na boca e no pescoço e me faz esquecer das coisas mais sóbrias e ínfimas da vida. E me segura de um jeito como há muito tempo eu não sentia. Ai.. e o cheiro dele? Adoro o cheiro dele.. esse cheiro que só os homens têm! Ai.. cheiro de homem! Chega a ser melhor que os homens em si.

Mas é sempre assim. No dia seguinte eu me levanto e tento, de qualquer forma, me lembrar dos detalhes, das partes que devo esquecer ou me desculpar, dos meus impulsos errôneos e dos bem sucedidos; e do quanto de diverti também. E penso quando é que o verei de novo.. apesar de não querer vê-lo. Assim não sofreria ao descobrir o babaca que ele é.. ou deveria ser pra que as minhas profecias se realizem. E penso que ele não é lá grandes coisas, não mexe comigo tanto assim; talvez seja melhor esquecê-lo de vez e continuar minha vida. Mas então, quando é que eu vou parar essa minha busca sem sentido se é que eu nunca chego a procurar de verdade, se é que desisto antes de tentar? Além disso, no começo é sempre assim. Foi assim quando conheci o homem que tanto amei pelos últimos 4 anos.. no começo, era assim.. simples assim.. braços, pernas, cheiros, risos, palavras delicadas e a minha danada insegurança.. ela, sempre ali.

E é sempre assim.. me lembro do quanto eu era jovem, inexperiente e sonhadora. Não que hoje seja muito diferente! Se eu não fosse tão romântica (e ainda sonhadora como sempre fui) não teria esse medo que me acompanha a cada noite acompanhada, a cada noite agradável, é claro. E foram poucas. As realmente agradáveis foram poucas. As que fizeram diferença, que dá vontade de lembrar, que guardo com carinho; foram poucas. Então, contabilizo essas poucas; e chego a pensar que os homens são todos iguais, que não há homens bons, desses com os quais a gente sonha.

E aí decido que não vou vê-lo mais! É sempre assim! Digo que não quero me envolver com uma pessoa que eu não conheço. Mas se não me envolver como vou conhecer as pessoas? E critico essa minha mania de sonhar, de acreditar que ele quer ficar ao meu lado, com aquele jeitinho tímido e tão sedutor de ser; ao mesmo tempo em que tenho a nítida certeza de que não passa de uma paixãozinha de algumas horas encobridas pela escuridão, de que não será mais que algumas cervejas naquele bar. Eu e essa minha ambigüidade, essa minha mania de ter medo de me envolver me envolvendo.. Esse meu sofrimento que não me faz parar mas atrapalha todo o brilho que deveriam ter aquelas horas.. Esse meu medo de conhecer os homens.. Mesmo que dias depois ele me ligue com alguma desculpa esfarrapada querendo esquecer a solidão. Eu teria medo de me entregar, porque quem aprende a ter medo não sabe viver sem ele.

É! É sempre assim.. ele vem todo lindo e cheiroso e eu, armada até os dentes, espero calmamente o dia em que não atenderei mais as suas chamadas.. e ele se tornará só mais uma lembrança gostosa, só um número no celular, só a possibilidade de ter sido algo que eu nunca admitiria que fosse..
[Postado por Gabi Moreira]

sábado, 6 de outubro de 2007

Do divórcio

Era uma daquelas noites nem frias nem quente, sem lua ou nuvens, nao ia chover, mas o céu tampouco estava bonito. Era mais uma noite normal, abafada e morna. O relogio batiam sete horas, quando a campainha tocou.
_Droga, dessa vez ele foi pontual, e eu nem terminei de tomar banho!
Ela olhou no olho mágico, e seu coração estremeceu ao ver o envelope amarelo nas mãos dele. Abriu a porta, enrolada na toalha branca, gotejando pelo chão, que ela tinha esfregado com tanto esmero durante a tarde.
_Desculpa, eu estava no banho. Senta aí enquanto você espera.
Ele se sentou, e olhou ao seu redor, viu as paredes, que tantas vezes testemunharam juras de amor eterno, brigas sem fundamentos, almoços de domingo e beijos displicentes. Viu o sofá roto, que ele comprara no crediário, de sete vezes sem entrada, antes tão novo, motivo de tanta alegira e hoje já tão velho, desbotado, mais ou menos como o casamento deles. Ele viu também o girassol de plástico, que ela tanto gostava. "Flor de plástico, sim, que é pra não murchar!". Tanta coisa murcha, a pele murcha, e se enche de rugas, as flores murcham, até a vida que eles construíram juntos, hoje parecia que murchara. Foi quando ele baixou os olhos, e reparou que o chão estava encerado, e que tudo ali cheirava a limpeza, e se lembrou da boa esposa que ela fora. Da casa sempre limpa, do frango com quiabo no domingo, da novela das oito, do cheiro de café de manhã. Não se sabe como, ele se perdeu no meio de toda essa rotina, dessa vida medíocre, mas tão cheia de encantos, que só quem ama vê. Tentou, então, inultimente, descobrir quando ele deixou de ser marido, pra ser o homem insensível, que deixava no balaio de roupa suja, para que ela lavasse suas cuecas maculadas de outras paixões. Nesse momento ele descobriu que o arrependimento é amargou, queima a garaganta e machuca o peito. Sua alma sucumbiu às lembranças que o templo, outrora lar da família que eles foram, trouxera.
Ela então, saíra do banho, com o cabelo solto, molhado, cheirando ao óleo de lavanda, que ela sempre usara. Ah! O cheiro de lavanda! O cabelo solto! Ah! era ela sua mulher! Era ela, que um dia entrou na igreja, com o vestido branco, simples, bordado a mão pela mãe. Era ela, que tantas vezes, fez um chá de mel com limão pra curar sua gripe, que dava o nó de suas gravatas, e enchia de alegria não só essa casa, mas toda a sua vida.
_Onde é que eu assino?- a voz saiu metálica, quase ensaiada.
E os olhos dele se encheram de lágrima, e ele chorou um choro sincero, e se ajoelhou aos pés dela, solenemente lhe pedindo perdão. Um perdão silencioso, pois tanta dor lhe comia as palavras. Ela, segurou a sua mão, o levantou, e lhe beijou na testa. Na testa, nas bochechas, cheirou-lhe o cabelo, sentiu-lhe a pele. Beijaram-se então na boca. E naquele sofá vinho, entre aquelas mesmas paredes, se amaram de novo pela primeira vez!

Postado por Anne Keat

quinta-feira, 4 de outubro de 2007

Flores de Outubro


O céu toma trajes de outubro e eu lembro, como se me esquecesse, do último outubro que vi. Azul liso, estendido e com grandes nuvens algodoadas, feito tarde de ir à escola ou de pegar a bicicleta e andar no asfalto recém colorido de amarelo e rosa. Cor de tarde, enfim...de sesta, de meio-fio e café.
Parece que meu último outubro foi há doze anos.
Tarde passada, pediram-me que comprasse flores. De casa eu via, da janela, os telhados e as copas com o verde antigo do mês sobre o céu comprido e liso. Mesmo os prédios tomavam jeito de roça ou de quintal...o conjunto de telhas e concreto tinha feição de mercearia de currutela e fazia merecer um bom café com queijo de acompanhamento. Bala de caramelo e sonho de valsa, comprados com moeda tirada do cofre a palito. Da minha janela, tudo era quase uma beira de estrada. Mas por dentro, era, ainda, meio Agosto, tempo nebuloso de idéias sem pensar, início de semestre em fim de Julho, a contra gosto e indefinido. Saí para comprar flores.
Eu que, muito raro, uso vestido, estava com um verde nesse dia – algumas roupas te caracterizam, te vestem de alguma coisa além de tecido. As árvores também estavam com um verde...! Talvez por ocasião de outubro e, talvez, eu por ocasião de comprar flores. Não que o traje fosse proposital, mas, assim também, as árvores não sabem da existência dos meses. Pretensiosa a minha metáfora a respeito de mim e das árvores, mas eu era, então, algo a mais do que eu mesma.
Eu mesma iria comprar as flores. Sou meio repleta de cadências literárias, coisa de loucura, vem de Cervantes e não tem como não vir. Loucura de ser gigante em ser personagem não poderia inspirar-se em outro, senão no sábio que escreveu o personagem que era louco em ser gigante. Meio a lógica da criança que sonha em ser gente grande e que cresce para sonhar em ser criança. Talvez a volta de Outubro tenha me infantilizado. As cores de infância no chão me fizeram desejar, não ser gente grande e caçar moinhos, mas eu brincava de Clarissa Dalloway e ia comprar flores.
...


Laís de Oliveira


Sete mulheres, sete caras, nomes, gostos, vozes, gestos, mas todas Madalenas de um só trilho.



Que esse trem vá longe!




Beijos e boas vindas a nós!

Imagem: A Donzela (A virgem) - Gustav Klimt

O Romântico que há em mim
[Gabi Moreira]

Certa vez meu irmão me disse:

“Você...
é muito romântica”

E então aquela imagem se defez.

Eu costumava ser liberal! Extrovertida!
Nem apaixonada, nem envolvida.

Mas aí
aquela imagem se desfez

E eu percebi porque nada me preenchia
Porque o beijo vazio de nada valia
Porque se não me ligasse
Falta fazia

E então eu vi o quanto estava cética
Que a vida não era tão patética
Que os filmes de amor tinham uma lógica
Que eu precisava era de uma vodka

Pra me esquecer
Pra fazer o dia escurecer
Pro meu irmão não ficar me olhando assim
Pra arrancar o romantismo que há em mim
Colado em mim
Impregnado em mim
Soldado em mim

E então eu soube
Que o vazio me pertence e nem tudo faz sentido



Postado por:: GABI Moreira

terça-feira, 2 de outubro de 2007

FUTILIDADES DA VIDA MODERNA

[Meuzinho]

Levanta
Toma um banho pra acordar
E corre pro salão pra se depilar
Depila todas as partes possíveis do corpo
Calor, dor e desconforto
Aí vêm os cabelos
Lava, enxágua, corta, pinta
enxágua, seca, escova, ajeita
Franja no meio ou pra direita?
E então faz as unhas
dos pés e das mãos,
afinal é o nosso cartão!
Você se apresenta: “oi, tudo bom?”
você dá a mão e ele vê seu esmalte marrom.
Marrom ou vermelho?
“Vou de renda hoje mesmo, tenho um encontro com um fedelho!”
Já foi na academia, horas de suor
Quer coisa pior?
Spinning, esteira, agachamento..
E yôga no final, pro relaxamento.
Relaxamento que nada! Quer é saber do bumbum:

“Tá durinho?”

“Tá redondinho?”

“Tá lisinho?”

E lá se vão litros de creme..
Pra amaciar, a celulite acabar, redondinho ficar.
E pro rosto? Aaaaah!

Tem creme pra olheiras porque nesse pique ninguém dorme!
E pras rugas porque a intenção é ficar sempre jovem!
E contra as espinhas porque elas destroem sua pele de bebê!
E pras suas manchinhas porque senão o mundo todo vai saber!

Vai saber que faz bronzeamento artificial;
que seu peito não é natural;
que sua barriga tanquinho é comprada;
que a última lipo não valeu de nada!!!

Tudo isso prum cara que só vai olhar o seu índice de massa corporal!

Coitada..

E eu aqui lendo Fernando Pessoa.
POSTED BY: GABI Moreira
PS: Sim! Hoje eu estou atacada!



O DESEJO ESTRAGA TUDO

[Gonçalo M. Tavares]


O desejo estraga tudo
Tenho 32 planos
52 projetos
30 estruturas perfeitas
O dia é claro e clamo e tem 24 horas

De repente chega o desejo e estraga tudo.

O dia fica claro demais

Calmo de menos

E já não há 24horas.

O tempo inteiro concentra-se num ponto
Aqui. (aponta o sexo)


Tenho o tempo concentrado aqui.
Muitos minutos concentrados no sexo.
O desejo é isto.
Ter órgão a mais para o tempo que faz lá fora.
Lá fora o tempo tem 24horas.
Cá dentro é bem mais pequeno.
O tempo entra todo pelo sexo e quer deixar de existir.
O esperma é o suicídio do tempo.
O esperma sobe para a torre e atira-se de lá de cima.
É um suicídio.
Um suicídio do tempo.



O desejo estraga tudo


Tinha tantos planos racionais pra hoje.

Os números eram quase perfeitos

O desejo estraga tudo, tudo.




Postado por: GABI Moreira

Da carta de amor que eu escreveria para ele


Outubro começou e trouxe uma notícia quase boa. O horário de verão começa dia 13, nos deixando uma hora menos afastados. Desculpa, por não ter te esperado acordada ontem, o cansaço foi mais forte. Mas como sempre vou te contar meu dia, pra que a gente se sinta mais perto.

Hoje de manhã eu passei o café, forte e sem açúcar, como você gosta, e como eu aprendi a gostar, eu fiquei tentando contar inutilmente, quantas xícaras mais eu vou tomar sozinha; se você estivesse aqui eu ia te lembrar de soprar, porque o café tá quente, e eu sei que você sempre queima o nariz com o vapor. Eu almocei com uma amiga, e falei de você, na verdade falei dos seus olhos, quase cinzas. Eu tentava explicar para ela, que cor eles tinham, mas faltavam exemplos, ai eu conclui que seus olhos tem uma cor, que só eles têm. Um verde cinza, talvez. Eu não sei se eu contava para ela, ou se era para mim. Pra não me deixar esquecer, não que eu vá esquecer, mas a nossa memória às vezes nos prega peças, você sabe, então eu fico continuamente reavivando seus detalhes, e assim também eu te trago pra mais próximo de mim, enquanto você não vem. À tarde eu vi um filme de amor, desses em que tudo sempre termina bem, e quis saber quando vai chegar o nosso final feliz, que dia vai acontecer o "foram felizes para sempre", quando vai começar o nosso ara sempre. Eu sei que nosso amor é bonito, complicado, e vai ter final feliz, eu sei que é um amor desses de cinema, mas eu preciso saber quanto tempo falta para o última cena, para que os créditos desçam, as pessoas saiam esperançosas da sala de cinema, e a gente possa então passar no supermercado, comprar o jantar e ir pra nossa casa, rir do programa chato da televisão e lembrar de tudo que a gente passou pra ficarmos juntos. Todo dia eu acordo pensando que podia ser o dia de ir ao aeroporto te buscar, ou ir para o aeroporto, pegar um avião e te ver me esperando. Todo avião que corta o azul celeste me enche de esperança, eu sei que um dia um de nós vai estar em um desses aviões e que finalmente a gente vai ficar junto. E eu penso na nossa casa, na casa que a gente vai ter, eu fico pensando em que país essa casa vai ser. Toda manhã eu acordo sem querer acordar, pra prorrogar um pouco mais os sonhos bons que eu tenho com você, e com seus olhos cinzas, mas eu acordo, eu olho pro relógio, somo cinco horas e tento imaginar o que você está fazendo. Aí eu tomo o meu café, forte e sem açúcar, como a gente gosta, aí eu seguro a xícara com força e engulo em seco para não chorar de saudade. Mas aí eu sorrio, porque eu sei como é bonito esse imenso triste mundo, e principalmente porque eu sei que em algum lugar, mesmo que bem além do oceano, alguém me ama. E um dia, em breve, esse alguém, que é você, vai estar aqui bebendo café amargo comigo.


Aqui é uma da manhã, aí já são seis e você deve se levantar em breve. Tenha um bom dia então, honey! Beijos!



Postado por: Anne Keat

domingo, 23 de setembro de 2007

Do dia em que Marieta nao conseguiu dormir

Eu daria tudo por uma dose de vodca agora. Tem noites que o dia insiste em não nascer. Minha cabeça está cada vez mais achatada no travesseiro, o teto do apartamento esta me sepultando na minha própria cama. A minha boca pedindo o gosto inebriante da vodca. A insonia me descontrolando, os calmantes secaram minha boca. E eu so penso na vodca. O apartamento está cada vez menor. Os barulhos da casa me deixam louca. O ralo engolindo a dor, a porta rangendo a ira, o vento se debatendo na janela com força arrebatadora. Essa noite eu nao consigo mais resistir, nao sem a minha vodca. Amanha eles vem me buscar, vao ver minha olheiras, os cacos de vidro pela casa, o meu rosto unhado, os cinzeiros transbordando. Amanha eles vao me levar para o medico, e eu vou fazer todos os exames, de novo. O medico vai me perguntar tudo de novo, da minha infancia, das minhas preferencias e dos meus medos. Eu vou dar as mesmas respostas vagas, e vou pensar na vodca. A culpa e do teto do apartamento, que toda noite rebaixa-se até quase me esmagar. A culpa é da vodca que acabou. O médico vai me olhar, vai pensar na minha vida sexual, vai me olhar com a caneta em riste, vai sentir um pouco de pena de mim e da minha vida mediocre. Vai lembrar do cheque no final do mes e vai me dar um diagnostico qualquer, que eu vou ouvir displicentemente. Vou olhar pro relogio e calcular o tempo entre aquela chatice e a vodca e vou prometer dar o melhor de mim e melhorar. Mas é mentira. Eu vou continuar querendo a vodca. Mas pelo menos amanha eu vou ter a receita e vou passar na farmacia e comprar minhas drogas. Mas enquanto o dia nao amanhece eu me sufoco com o travesseiro, engolindo o grito, rasgando o garganta. Ah, se eu pudesse beber a minha vodca!


Postado por: Anne Keat